O Evangelho segundo João é uma obra peculiar de raro brilho, o episódio da ressurreição de Lázaro é o ensejo da ação de Deus no coração da humanidade. A reanimação de Lázaro faz ecoar o sentido profundo para a fé e, portanto, exige que descubramos o maciço e autêntico milagre para além daquilo que ocorreu materialmente.
No Santo Evangelho deste domingo, o autor sagrado põe em evidência o reavivamento de Lázaro, o irmão de Marta e de Maria, aquele que dormia profundamente no vale da morte, isto é, sem vida e sem saúde. Jesus, a luz do mundo, tem um amor profundo pela família de Betânia, bem como por Lázaro, Marta e Maria. Lázaro, estando doente, simboliza a própria enfermidade da humanidade em situação de morte espiritual. Contudo, as irmãs de Lázaro mandam chamar Jesus: “Senhor, aquele que amas está doente”. Ouvindo isso, Jesus disse: “Esta doença não leva à morte; ela serve para a glória de Deus, para que o Filho do Homem seja glorificado por ela” (Jo 11, 3-4). Jesus acrescenta: “Nosso amigo Lázaro dorme, mas vou despertá-lo”. Neste âmago, um broto de esperança ressurgiu na história sagrada, pois a morte não tem a última palavra sobre a humanidade ferida de pecado e por isso mesmo destinada a morrer (cf. Dn 12, 2). Então “Jesus deixa que a morte física morra para que então ressurja a vida nova” (Konings).
Isso posto, quando Jesus chega a Betânia, encontra Lázaro há quatro dias morto, quatro dias na mentalidade judaica/semita significam seguramente morto! Ao saber que Jesus chegou, Marta vai apressadamente ao encontro do Senhor: “Senhor, se estivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido…” (Jo 11, 21). Jesus disse: “Teu irmão ressuscitará” (Jo 11, 23). Respondeu-lhe Marta: “Eu sei que ele ressuscitará na ressurreição, no último dia” (Jo 11, 24). Marta, totalmente distraída, acredita na “ressurreição no último dia” (Dn 12, 2; 2Mc 7,9). Todavia, Marta não percebe que a ressurreição se encontra diante de si. Aqui começa o diálogo revelador em que Jesus disse-lhe: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim não morrerá jamais. Crês isto?” No exuberante diálogo revelador, Marta caiu em si e faz a sua profissão de fé: “Sim, eu creio firmemente que tu és o Messias, o Filho de Deus, que devia vir ao mundo” (Jo 11, 27).
Marta, ao perceber que o definitivo de Deus, isto é, Jesus Cristo, se encontra diante de si, corre apressadamente para que Maria, sua irmã, conheça o dom de Deus: “O Mestre está aí e te chama”. Quando Maria ouviu isso, levantou-se depressa e foi ao encontro do Senhor. Os judeus que a consolavam pensavam que ela ia chorar no túmulo de Lázaro e a acompanharam. A grosso modo, os judeus não falam com Jesus, mas falam de Jesus. Então, os judeus disseram, em tom de ironia: “Vede como ele o amava! Alguns deles, porém, diziam: ‘Este, que abriu os olhos ao cego de nascença, não podia também ter feito com que Lázaro não morresse?’”.
Neste exato momento, Jesus “agita-se no espírito”, vai ao túmulo de Lázaro e fala como alguém revestido de autoridade: “Tirem a pedra”. A pedra, na cultura judaica, simboliza a separação de dois mundos – o coração de carne e o coração de pedra. Pois quem não se abre para a vida mesma em Deus se encontra com o coração petrificado e, portanto, morto espiritualmente e preso em si mesmo e em seu “ego”.
Jesus grita em voz alta: “Lázaro, vem para fora!”. Aquele que havia morrido, ao escutar a voz do Bom Pastor, saiu do vale dos ossos secos, com as mãos e os pés atados e com os lençóis mortuários. Então, Jesus disse: “Libertai-o e deixai-o caminhar” (Jo 11, 44). Deixai-o sair do vale da morte, desatai-o do feto e do útero que o mantém distante de Deus e do seu eterno amor.
Por fim, Marta, Maria e Lázaro progridem em matéria de fé ao abrir-se para graça de Deus. Os irmãos foram encharcados e revestidos com o manto da ressurreição e agraciados pelo mistério vital daquele que destruiu a morte para sempre: ‘quem crê em mim, mesmo que morra, viverá’.
Peçamos a Cristo que faça brilhar em nós que caminhamos neste tempo quaresmal, em que nos preparamos para celebrar a Páscoa, a esperança da ressurreição, a fim de que, em meio às dificuldades da vida, o vejamos como Aquele que já venceu a morte definitivamente e abriu a nós as portas da eternidade. Que ele nos ajude a caminhar com coragem e confiança, ajudando os irmãos, especialmente os que se encontram prostrados por diversas situações de morte e pecado, escravos de tantos vícios, bem como os famintos de pão, mas também de amor e atenção, a fim de um dia experimentarmos nele a vida que brilha para sempre. Amém.
Por pe. Rivaldo Oliveira da Silva, CSC
Capelão do Colégio Notre Dame