Política de prevenção e enfrentamento às violências no ambiente escolar

Apresentação

A Lei 14.811/2024, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 15 de janeiro de 2024, criminaliza os atos de violência e agressão, entre os quais o bullying e o cyberbullying, havidos no ambiente escolar e similares, estabelecendo medidas de proteção à criança e ao adolescente diante da ocorrência de tais atos.

Já em 1959, a Declaração Universal dos Direitos das Crianças chamava os países signatários da ONU (Organização das Nações Unidas) à responsabilidade de respeitarem as necessidades básicas e os direitos das crianças. Um pouco mais tarde, em 1989, Assembleia Geral da ONU tornou crianças e adolescentes sujeitos de direitos- decisão ratificada por 196 países.

No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)– Lei 8.069/90 tornou-se um marco, ao assegurar, no  Art. 15, que  “A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.” Depreende-se daí que o Estatuto avança em princípios e valores sobre a dignidade humana — dentre eles, o de proteção integral às crianças e adolescentes.

Embora essa legislação receba, hoje, reconhecimento de valor em nível internacional, seguimos na luta e atentos para sua efetiva implementação, que, em muitos casos, ainda está distante do mundo real, pois, infelizmente, a violência é uma realidade em muitos ambientes sociais, inclusive nas escolas brasileiras. É nesse contexto que recebemos, como um importante avanço na legislação brasileira, a Lei 14.811/2024, que institui medidas de proteção à criança e ao adolescente contra a violência nos estabelecimentos educacionais ou similares e determina, no Código Penal, medidas mais rigorosas contra todo tipo de agressão, inclusive o bullying e o cyberbullying. Como pressuposto, a referida Lei nos obriga a considerar sobre a gravidade de práticas agressivas de qualquer espécie e reforça a importância de promover ambientes escolares seguros e acolhedores para todos os atores que protagonizam os processos educativos que se desenvolvem nas escolas, assegurando, desse modo, que se adotem, amplamente, medidas de conscientização, prevenção, diagnose e combate eficaz à violência.

O novo cenário trazido pela legislação é, sem dúvida, um importante instrumento de desestímulo aos reprováveis atos de agressão ou intimidação sistemática, assim minimizando efeitos negativos no quadro emocional dos estudantes e, até mesmo, no clima escolar como um todo.

No entanto, não traz, às escolas de Santa Cruz, um foco ou preocupação novos. A Congregação de Santa Cruz, organização religiosa mantenedora de três Colégios[1] no Brasil- têm a missão educativa em sua essência e sempre esteve atenta e atuante em favor das mais valorosas atitudes em direção à promoção da dignidade e do bem-estar humano.

A referida missão encontra sua tradução em projetos educativos convergentes com as realidades locais e responsivos às necessidades emanadas dessas realidades. Em todos os casos, os projetos educativos postos em ação em nossas escolas estão sustentados em pilares educacionais, como “educar mentes e corações”, “construir respeito”, “ser família” e “portar esperança”. Assim, respeito, empatia e responsabilidade estão na base de nossas ações e ancoram nossos projetos educativos. Por essa razão, nossas diretrizes para tratamento da prevenção e encaminhamento dos fatos trazidos pela lei já estão na base da concepção educacional e formativa de educandos e educadores de Santa Cruz, preparando o cidadão para lidar com suas emoções e as do outro, nos dias de hoje e no futuro, nas relações pessoais e na vida em sociedade.


[1] Colégio Dom Amando (Santarém- PA); Colégio Santa Cruz (São Paulo-SP); Colégio Notre Dame (Campinas- SP).

Fortalecendo o desenvolvimento integral e as competências socioemocionais nas práticas educativas

No ideário da Educação de Santa Cruz[2], apontamos que uma escola de Santa Cruz é uma comunidade em que o trabalho educativo é uma obra coletiva. “(…) O respeito está enraizado na dignidade a que cada ser humano tem direito. Onde se cultiva o respeito mútuo, não prosperam o egoísmo, as separações e todo tipo de exclusão”. (p.39)

Assim, a educação de Santa Cruz se nutre em um ambiente de acolhimento, favorável à promoção de relações saudáveis e convidativas à vivência e ao desenvolvimento das competências socioemocionais que ultrapassam a dimensão cognitiva e contribuem para o estabelecimento de vínculos de apoio e confiança.  Entende-se que esse ambiente é cenário essencial para que as relações humanas se deem em favor da empatia, tolerância, da valorização da diversidade e da afirmação da pluralidade, como está implícito no espírito da lei que busca ambiente seguro e protetivo para nossos estudantes.

Para que assim aconteça, …

 


[2] Educação de Santa Cruz em Movimento. Publicação interna. Disponível em: https://indd.adobe.com/view/bea9c30c-b3c3-4964-988d-149dbd9f90e1.

1. Em nossas práticas pedagógicas curriculares,

  • incentivamos a superação da fragmentação do conhecimento por meio da construção de saberes significativos e interconectados, frutos de projetos interdisciplinares.
  • estimulamos o espírito investigativo, levando alunos e educadores a refletirem sobre realidades diversas, deslocando olhares autocentrados para perspectivas mais críticas e pontos de análise integrativos.
  • oferecemos oportunidades múltiplas de trabalho em equipe, de modo a ampliar possibilidades de convívio com o diverso, reconhecer o valor da contribuição de todos e de cada um, acolhendo-a e integrando-a ao resultado do coletivo.
  • encorajamos o protagonismo, que, ao fortalecer a autoestima, contribui para escolhas responsáveis e conscientes.  

2. Na proposição de recursos metodológicos,

  • incentivamos modalidades que envolvam metodologias ativas, permitindo que os alunos desenvolvam habilidades relacionadas à análise crítica e responsável, à comunicação proativa, à autonomia, além de valorizar diferentes percursos de aprendizagem.
  • valorizamos a tecnologia como ferramenta complementar aos modos de conhecer, colocando-a sob controle do planejamento, das opções didáticas e a serviço do processo de ensino-aprendizagem.
  • nos processos formativos, reconhecemos a existência do bullying e do cyberbullying, além de outras formas de agressão e intimidação sistemática, refletimos sobre esses fatos, buscamos e compartilhamos medidas preventivas e curativas em relação a eles. São exemplos:
    • Realização das campanhas de prevenção e orientação, especialmente (mas não exclusivamente) sobre bullying e cyberbullying.
    • Ciclos de palestras. Exemplo: Conhecer para Combater. Participação de profissionais especialistas e autoridades competentes.
    • Escuta ativa, atenta e acolhedora (vítimas/ agressores/famílias/colaboradores…). 
    • Encaminhamento a famílias e outros atores significativos no cenário emocional dos envolvidos.
    • Encaminhamentos aos órgãos competentes que compõem a rede apoio constituída.
    • Diálogo com especialistas que atendem os alunos fora do ambiente escolar, para escuta, planejamento, encaminhamentos e orientações convergentes.
    • Programa de Orientação Educacional estabelecido em todos os segmentos de ensino ofertados nas escolas, de modo a contribuir com a construção de valores sólidos e desenvolvimento de habilidades socioemocionais necessárias a opções relacionais saudáveis, em que prevaleçam o respeito, a empatia, o diálogo, a confiança. O serviço de Psicologia escolar está direta ou indiretamente envolvido no planejamento e desenvolvimento do Programa de Orientação Educacional.  

Em caso de denúncia

Em nossa postura como educadores, procuramos garantir a divulgação sobre existência de canais de denúncia seguros na escola e fora dela, evidenciando que denunciar é um ato corajoso e contribui para criar um ambiente mais seguro e saudável.

Ao lado desse cenário mais amplo de medidas de combate às ações de intolerância, violência, agressividade, bullying ou cyberbullying- além de outras nocivas à vida e ao bem-estar previstas na lei, buscamos instituir alguns parâmetros de atuação, que, em linhas gerais, podem ser vistos como uma espécie  de protocolo, na forma procedimentos internos a serem seguidos, estabelecendo um fluxo claro de ações a partir do momento da denúncia, como medidas imediatas de proteção e acompanhamento dos envolvidos. Cabe aqui destacar que o ato de denúncia é direito de qualquer membro da comunidade escolar, devendo ser dirigido, privilegiadamente, ao setor de orientação educacional vinculado ao segmento de estudos responsável pelo processo educativo dos envolvidos. Na eventual ausência deste, a denúncia pode ser levada a outra(s) liderança(s) escolar(es) (coordenador, professor, diretor…), setor que se responsabilizará por seu encaminhamento seguro e sigiloso.

Mediante denúncia, a escola inicia a escuta atenta e o acolhimento da vítima e familiares. A seguir, avançando para a fase de monitoramento, inicia, com zelo e atenção o trabalho interno de esclarecimento dos fatos, sempre de forma sigilosa e protetiva da exposição dos envolvidos, incluídos aqui o(s) suposto(s) agressor(res) e familiares. Acompanhamento e apoio são oferecidos aos envolvidos durante todo processo. Se confirmada agressão e/ou intimidação sistemática, a escola aplica as medidas disciplinares previstas em Regimento Interno, devidamente comunicadas aos alunos e famílias e propostas com o objetivo de fomentar a reflexão sobre os fatos e a construção de ações de prevenção e reparação.  Destaque-se, assim, que as sanções serão proporcionais à gravidade e frequência das ações, visando à reeducação e reparação de danos.

Ao longo do processo e quando oportuno, será disponibilizada a orientação sobre eventuais medidas legais- a possibilidade de responsabilização civil ou criminal nos casos graves e, quando necessário, o encaminhamento a Órgãos Externos, a saber: Conselho Tutelar- encaminhamento em casos de negligência ou violência contínua; Delegacia Especializada: para casos que envolvam ameaças, extorsão ou exposição indevida de imagens e  Ministério Público.

A escola indica a necessidade de acompanhamento regular os alunos para evitar novos episódios, além de reuniões periódicas com as famílias, mantendo um canal aberto de comunicação com os pais para garantir o bem-estar dos alunos.

Com vistas a favorecer a reflexão constante entre os educadores, a escola deve manter registro objetivo e completo de suas ações, o que também deve subsidiar a avaliação das ações implementadas.